Proposta de lei visa regular direitos autorais

Proposta de lei visa regular direitos autorais

Thiago Stivaletti
25 out 16

Imagem destaque

Frederico Mendes/Divulgação

O cineasta Sylvio Back, presidente da ABCA

Nas últimas semanas, o audiovisual brasileiro deu importantes passos em uma questão que vinha adormecida: a distribuição de direitos autorais para os criadores, relativos à exploração de suas obras dentro e fora do país.

No Congresso Mundial dos Criadores de Audiovisual, realizado no Rio, o ponto alto foi a distribuição de US$ 142 mil em direitos autorais repatriados da Argentina, referentes a 95 obras de cinema e TV de 40 diretores brasileiros. Entre eles, nomes como Walter Salles, Lúcia Murat, Cacá Diegues, Bruno Barreto, José Padilha, Arnaldo Jabor e Fernando Meirelles.

No evento, o cineasta Sylvio Back, presidente da DBCA (Diretores Brasileiros de Cinema e do Audiovisual),  anunciou a proposta de lei relativa aos direitos de remuneração dos diretores e roteiristas audiovisuais,  que leva o nome de Lei Nelson Pereira dos Santos, apoiada pela experiência das associações estrangeiras presentes ao evento.

Abaixo, Back explica os esforços da associação para melhorar a arrecadação aos autores brasileiros.

 

Por que o Brasil foi escolhido para sediar o Congresso este ano?

Na Europa e na América Latina, o pagamento de direitos autorais para diretores e roteiristas é motivo de interminável questionamento. A Argentina e o México há tempos saíram na frente. Lá, entidades coirmãs da nossa cobram pela comunicação pública da obra royalties de quem a emite, os chamados usuários (não confundir com consumidores) - sejam TVs broadcast ou por assinatura, veiculadas em telonas ou telinhas como o celular, ou retransmissão através de TVs a cabo, streaming ou armazenadas em nuvens.

Somente nos últimos dois anos é que os fatos do universo digital vêm comandando a retomada desse ideário civilizatório. Em qualquer instância audiovisual, direito autoral é o salário do criador. Assim, se há pouco mais de um ano éramos 13 os cineastas fundadores da DBCA, atualmente já somos 200 com mais de 800 obras registradas.

Quais são as principais dificuldades, dentro do mercado latinoamericano, para o recebimento de direitos autorais do audiovisual? Que mecanismos podem ser implementados nos próximos anos?

A dificuldade de remuneração depois da obra pronta atravessa a América Latina. Excetuando Argentina e México, com o Brasil na cola, Chile e Colômbia estão prestes a ter suas novas leis de direitos autorais aprovadas. Entre nós, embora a Lei do Direito Autoral, aprovada junto com a Constituição de 1988, garanta ao diretor a cotitularidade de autor, ainda não foi regulamentada a arrecadação e distribuição aos diretores e roteiristas os direitos relativos à comunicação e retransmissão ao público da obra audiovisual. Persiste um horrível descompasso entre músicos, roteiristas e diretores. Só os músicos conseguem receber proventos pela reprodução de suas criações, os outros dois entes ficam excluídos. Queremos isonomia, simples assim.

Qual é o caminho que o direito autoral faz hoje para chegar ao seu recebedor? Há muitas taxas e impostos envolvidos?

Com exceção da entidade italiana de direitos autorais, que é estatal, todas as demais, como a própria DBCA, são privadas e sem fins lucrativos. Isso significa que, uma vez repatriado o direito autoral, sobre ele incidem os encargos habituais para ingresso de recursos de pessoa física no país. Um percentual cabe estatutariamente à DBCA para seu custeio, sendo que expressivo montante será canalizado para um chamado Fundo de Ação Social, que pretendo seja a marca humanitária da minha administração à frente da entidade nos próximos dois anos, dos três para os quais fui eleito. Seremos nós, os próprios cineastas, financiando a dignidade da profissão. Virão desse fundo os recursos para cuidar de quem está em atividade e para quem, por alguma razão (entressafra de projetos, desemprego, saúde debilitada, idade) teve que parar de trabalhar ou se aposentar.

O Brasil é um bom ou mau pagador de direitos para profissionais do audiovisual de outros países?

O Brasil é um não pagador desde sempre para esses criadores. Mesmo entre os cineastas e diretores de TV, vige um equívoco pelo fato de muitos de nós acumularmos as funções de produtor e diretor de uma obra – quando não somos também nossos roteiristas. Com isso, passa-se a impressão de que, uma vez pagos para realizar o filme ou novela, nosso comprometimento acaba ali. Acontece que a criação é umbilical à própria obra. Portanto, a cada veiculação ao longo dos anos, das décadas, ela está presente e exige remuneração, já que o produtor acompanha para sempre o êxito da obra. Por que para nós seria diferente?