Referência
no mercado de
cinema no Brasil
Depois de cinco dias de discussões envolvendo mais de 50 profissionais do audiovisual, o Fórum de Tiradentes, realizado na cidade histórica mineira, dentro da Mostra de Cinema, divulgou, na tarde de ontem, um conjunto de diretrizes consideradas essenciais para a “reconstrução” do setor audiovisual brasileiro.
O documento sintetiza os diagnósticos e as recomendações produzidos por cinco Grupos de Trabalho (GTs): formação, preservação, produção, distribuição/circulação e exibição/difusão.
Esses grupos se debruçaram sobre questões específicas de cada área e, posteriormente, dividiram seus documentos com os demais grupos — numa dinâmica que procurou olhar para o audiovisual de forma transversal.
A coordenação executiva coube a Raquel Hallak, diretora da Mostra de Cinema de Tiradentes, e a Mário Borgneth e Alfredo Manevy, que trabalharam como gestores públicos do setor em diferentes governos do PT.
Cinema independente
O texto lido por Hernani Heffner, do grupo de preservação, e Vânia Lima, do grupo de produção, começa com duas perguntas: “Como se destrói um país?” e “Como se constrói um país?”.
Depois de desfiar os ataques sofridos pelo setor cultural e, em particular, o audiovisual desde 2016, o texto afirma que o Fórum espelha o tema da Mostra de Cinema de Tiradentes de 2023: Cinema Mutirão.
Embora o cinema dito industrial — ou aquele que tem nos resultados comerciais seu principal objetivo — estivesse representado nos GTs, foi, sobretudo, o “audiovisual de feição realmente independente” que deu o tom ao encontro.
Agenda ampla
Nos trabalhos produzidos por todos os grupos, tiveram grande destaque as demandas por políticas afirmativas e por ações específicas para regiões e territórios desfavorecidos.
Isso não significou, porém, a ausência de demandas particulares para cada setor. Ao contrário.
A presença de profissionais de perfis muito variados possibilitou um mapeamento aprofundado do ecossistema audiovisual e das relações entre as diferentes atividades e os diferentes perfis de produção.
“O todo passou a olhar para o específico de cada setor”, disse Borgneth, na apresentação. “Essa metodologia foi muito rica porque permitiu que cada campo de trabalho pudesse se expressar.”
Os documentos finais a serem ainda sistematizados trarão uma ampla agenda, que tende a pautar parte da política audiovisual nos próximos quatro anos.
“Esperamos que este encontro marque um momento novo para o audiovisual, e que outros diálogos como este possam acontecer”, disse Manevy.
Streaming e Cota de Tela
Neste primeiro momento, a carta fechou o foco sobre as recomendações consideradas “estruturantes e transversais”.
O documento será encaminhado ao Ministério da Cultura, à Secretaria do Audiovisual e à Ancine, e depois disponibilizado para toda a sociedade.
Dentre os itens elencados, tem destaque o “resgate e a qualificação” do tripé da institucionalidade da política audiovisual. Isso significa devolver ao Conselho Superior de Cinema o seu papel de formulação de políticas ao setor, e, à Secretaria do Audiovisual, o protagonismo e capacidade operacional.
Pediu-se também a criação do Marco Regulatório do Fomento à Cultura, “para dar segurança jurídica ao setor cultural e garantir a plena execução e alcance das Leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc 2”.
No que diz respeito ao funcionamento do mercado, foram tratados como temas prioritários a regulação do streaming; o restabelecimento da Cota de Tela nas salas de cinema; a prorrogação das cotas previstas na Lei 12.485 (2011); o incremento nas linhas não reembolsáveis no Fundo Setorial do Audiovisual para todos os segmentos; e a prorrogação da Lei do Audiovisual.
Os desejos de cada um
Em uma plenária realizada na terça-feira 24, ou seja, um dia antes da redação da Carta de Tiradentes, cada grupo apresentou dez recomendações setoriais.
O grupo de exibição mostrou a enorme variedade de modelos de negócios que o digital trouxe para o setor e, ao mesmo tempo, reforçou sua crença no forte papel da sala de cinema para o ecossistema do audiovisual.
No caso da distribuição, uma premissa antecedeu as sugestões: projetos de perfis e tamanhos distintos demandam diferentes modelos de políticas públicas.
Se o setor da produção, historicamente o mais articulado elo, organizou demandas já bastante conhecidas, os GTs de formação e preservação puderam expor suas pautas para profissionais que quase não as ouvem e mostrar sua centralidade para a sobrevivência e o crescimento do setor como um todo.
*Ana Paula Sousa integrou o GT de Distribuição do Fórum de Tiradentes
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